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Maria das Palavras

A blogger menos in do pedaço, a destruir mitos urbanos desde 1986. Prazer.

15
Set15

Comparti(mentalizar)

Maria das Palavras

Compartimentalizar | Maria das Palavras (imagem Pixabay)

Consigo dividir a vida em frações. Sabem aquele vídeo em que um tipo descreve as diferenças entre homens e mulheres? Os homens têm cada assunto em caixas separadas, bem arrumadas, que se vão buscar quando são necessárias, as mulheres têm um novelo sem fim, com tudo interligado. Eu sempre fui mais como os homens. Tenho secções bem definidas em áreas arrumadas, como na melhor página do catálogo do IKEA.


Por exemplo, quando o meu avô  morreu, e a fim de um tempo, pu-lo numa caixa. Dito assim parece cruel, ou que estou a fazer uma piada mórbida. Não é isso. Arrumei a minha dor numa caixa enorme que ocupou uma divisão inteira na minha cabeça. Empurrei-a para os fundos. Só vou buscá-la quando não consigo mesmo evitar esse corredor. Deixei as boas recordações (e são tantas) numa caixa mais acessível, numa prateleira daquelas que uso muitas vezes. Está na estante da família, ponto geográfico: Leiria. As coordenadas sei de cor.

Há quem diga que por fazer isto sou fria, que estou a evitar sofrer e a acumular dores por não extravasar. Não é verdade. É a minha forma de lidar com as coisas e não há nenhum espaço a apodrecer nesta minha mansão. 
Faço isso com tudo, não só o que é mau: também organizo o que é bom (amigos aqui, ambições pr'ali). Não é um processo logístico complicado, não preciso de contratar um (ar)Mário a recibos verdes para dar conta do recado, é-me natural. Umas têm material frágil, outras inflamável, é só ler a indicação. Depois, às vezes, em vez de chorar, escrevo. 

 

Isto para dizer que é assim que eu reconheço um problema sério: as prateleiras das caixas caem em dominó. E porque a vida não é (para grande desilusão geral) um catálogo do IKEA não posso fazer logo compartimentar e tenho de me mentalizar para isso. Obrigam-me a trocar caixas de uns lugares para os outros e algumas enchem e ficam a transbordar, tocando a próxima. Ou não me deixam fechar a caixa delicadamente, embora seja óbvio para mim que já não é necessária. Ou tenho de passar tanto tempo a arrumar uma caixa que me esqueço das outras. E não faz mal. Porque no fim hei-de pegar nisso tudo que correu mal e arrumar nos fundos. Deixo cá à frente as lições, as boas recordações, e o futuro todo, embrulhados num cartão que diz "este lado virado para cima". 



 

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13
Ago15

Dores de crescimento

Maria das Palavras

Murro - Pixabay free images

 

A dor está na génese de muitas coisas boas. 

Doem os dentes que começam a rebentar na boca do bebé de meses. Dói à cabeça à estudante de direta que tem de decorar 600 páginas de vocábulos impossíveis. Dói o músculo cansado de quarenta minutos de cycling no ginásio. Doem no lombo as horas extraordinárias de trabalho do motorista dos expressos.  Dói o diafragma do saxofonista que acaba o concerto da sua vida. Doem as contrações na fase final final da gravidez - e os pés inchados, senhor, durante os nove meses. Doem os braços de carregar as malas até ao hotel que marcamos naquela cidade onde vamos passear uns dias e fica longe da estação. Dói o coração outra vez desfeito da nossa amiga.


Às vezes - muitas vezes - não faz mal termos de nos enroscar em nós mesmos e gemer até àquele momento distante (seja dali a meia hora ou meio ano) em que a dor passa. Porque às vezes - muitas vezes - a seguir à dor a vida traz um analgésico muito mais poderoso. Porque às vezes - muitas vezes - sem essa dor não saberíamos o sabor do alívio. E sempre - não só as vezes - a dor faz-nos crescer. 

 

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28
Nov14

O pior de se ter um cãozinho de estimação

Maria das Palavras

How to draw a dog - howtodrawanimals.co

 

 

Não são os pêlos pela casa. Ou o espaço que o bicho ocupa com as suas tralhas, camas, brinquedos. Nem o barulho que faz a ladrar para os outros cães em época de cio. Não é a chatice de ter de se levar à rua. Mesmo à chuva. Mesmo às sete da manhã. Nem ter de gastar dinheiro em vacinas e desparasitação. Ou na ração XPTO que é a única que o menino gosta. Nem vê-lo a pedir por favor com olhinhos meigos quando estamos a roer tremoços e ele também quer. Rondar a mesa à hora das refeições quando está a avó que ele sabe que lhe dá sempre um bocadinho de carne do prato. Não é ele não parar quieto e estar sempre a querer brincar. Nem roer os chinelos e os sapatos. Não é que faça chichi no puff da sala enquanto ainda está ser treinado para ir à rua. Nem que corra atrás das bicicletas feito maluco. Que traga lixo para casa da rua, orgulhoso, entre os dentes. Que traga pulgas e carraças para casa por ter rebolado nas ervas secas que depois temos de ter paciência a tirar. Não é que espalhe as cinzas da fogueira apagada e tente até comê-las. Não é que não responda ao NÃO que pronunciamos firmes tantas vezes como gostaríamos e logo desde pequeno. Nem que esteja sempre a trazer de volta o brinquedo que apita para atirarmos uma e outra vez. Nem que esteja sempre a subir para o sofá ou para a cama - contra a nossa indicação, mas para nossa delícia.

 

É que - não sendo como as velhacas das tartarugas - eles têm uma vida mais curta que a nossa. E a dor de os perder é diretamente proporcional a todas as chatices (leia-se carinho) que nos prestaram.

 

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