Sou a blogger menos in do pedaço #66
Há semanas que preciso de uns sapatos azuis para um casamento que está próximo e a Zilian ainda não se chegou à frente.
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Há semanas que preciso de uns sapatos azuis para um casamento que está próximo e a Zilian ainda não se chegou à frente.
O Moço lá achou que após determinada quantidade de tempo a aturá-lo (que o dificil de aturar é ele - claro, claro! *cof* *cof*) eu merecia um miminho e ofereceu-me uma linda mala da Parfois: gira, tamanho ideal e-tudo-e-tudo.
Lá me confessou que me queria ter oferecido as botas que eu mencionei neste post - elah! agora vejo o poder do blog - mas tinha ido à loja ao Colombo e não havia.
E o que é que está errado aqui? O "tinha ido à loja". A Forever21, de onde vêm as botas, é uma loja...online.
Ele também se apercebeu, depois de ter perguntado por elas à senhora da loja e conferido o post com mais atenção.
Ia buscar as botas da Forever21...à Foreva.
Potatoes, potatos.
Hahahahahaha!
Não tenho um único par de sapatos que me tenha custado um valor de 3 dígitos (nem muito perto).
Não uso Paez, nem Birkenstock.
Hoje estive com ela e não me ameaçou com o chinelo. Mas não é porque eu já tenho 28 anos e ela até estava com dores nas costas. Foi só porque eu não me portei mal.
Se não me engano nunca o senti, mas muitas vezes ouvi "olha que levas com o chinelo!" e punha-me em sentido. Às vezes olhar ou apontar para o dito bastava. Ou descalcá-lo por um segundo.
Passei muito tempo em casa dos meus avós, durante a infância, e nunca precisaram de proibir a televisão ou pôr-me de castigo colada a uma parede para que me portasse bem. E eu até posso ser uma bem-comportada de feitio, mas com a minha irmã foi o mesmo - e ela era tudo menos bem-comportada de feitio...ou de alma, ou de corpo, que a miúda ainda hoje (que já não é miúda) continua a ser torcida.
O segredo era simples. E não era o chinelo da minha avó, mas o conceito que transportava na sola ou no pano (quase sempre azul). Era o mesmo conceito que se prendia nos olhos do meu pai olhando fixamente para mim.
Uma palavra: disciplina.
Mas não acredito nem por um segundo que isso fosse um exclusivo do saudoso passado. Continua a haver disciplina nos lares e nas crianças. Nalguns e nalgumas. Naquele tempo também tinha coleguinhas de escola sem respeito a nada. E não acredito que alguns não tivessem levado até toque de cinto em casa. Que fosse tão simples como: melhor educação, melhor comportamento. Não o era, como não o é hoje em dia.
E a única mágoa que tenho é que ao mesmo tempo que a minha avó me ensinava o que era o respeito com uma peça de calçado eu não tenha ganho aversão a sapatos. A minha carteira e o meu homem (que tem sempre só 30% do espaço de arrumação que é dos dois) agradeceriam.
O autocarro estava muito atrasado e ela não podia esperar mais. Então, mesmo debaixo daquele calor surdo às queixas da velhota sentada à sombra, pôs-se a caminho. Desejou ter calçado saltos altos. Ninguém a percebia, porque é suposto os rasos serem tão mais confortáveis. É que os saltos altos marcam compasso e pontuam a caminhada. E têm o conforto da beleza, que ela tanto quer fingir.
Foi quase sem reparar que reparou. Talvez tenha virado a cabeça para sacudir o cabelo que lhe passeava nos ombros. E viu a entrada para a rua dela. Já não era a rua dela, na verdade. Mas foi por muitos anos. A rua onde reconhecia a porta e subia até ao último andar para o apartamento velho que chamou de casa por uma década. Que partilhou com uma amiga, com ninguém, com a irmã, com o seu amor. Onde recebeu amigos para verem sentados no chão o Portugal x Inglaterra do Euro 2004 e comerem bacalhau com natas como a mãe lhe tinha ensinado a fazer. Onde levou rapazes diferentes para beijos diferentes e desilusões diferentes. Onde chorou, sorriu, deseperou, foi feliz.
Pensou nisto tudo naquela fração de segundo em que reparou na rua. Talvez tenha virado a cabeça para sacudir o cabelo que lhe passeava nos ombros. O calor não dava descanso e ela não dava descanso aos sapatos rasos, que deviam ter salto alto, para lhe marcar o compasso e pontuar a caminhada. Já estava atrasada. Que a vida não pára.
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