A diferença está do lado de cá
Fui ver o filme A Rapariga Dinamarquesa há umas semanas, com duas das pessoas com quem mais gosto de ir ao cinema. A minha amiga de sempre, que tem a minha idade. E a minha irmã, um bom conjunto de anos mais nova do que nós. Apanhei uma valente desilusão, mas não foi bem com o filme.
Não sei em que momento da vida cresci para a realidade das diferenças (sei que não é de sempre) ou se é questão geracional ou de feitio. A minha irmã viu o filme com uma curiosidade saudável para perceber como era ser um transexual há tantos anos atrás num sociedade intolerante e desinformada (talvez intolerante porque desinformada). A minha amiga, torceu logo o nariz ao tema e nem deixou que o filme a supreendesse, toldada pelo preconceito. Pareceu-me desligada do seu tempo e parte da sociedade que o filme retrata. Talvez há dez anos atrás, sabendo menos, tolerando menos, sendo menos, eu tivesse tido a atitude dela. Mas é afinal, tristemente, uma reação do tempo presente: já temos informação, mas continuamos a não ser tolerantes - ou até evitamos a própria informação, toda a que não diga que ser diferente é ser doente. Toda a que admita desvios à norma. Toda a que nem queira desenhar normas, porque a individualidade é um facto.
A minha irmã aprendeu, então, mais do que como era a sociedade de há tantos anos face à transexualidade. Aprendeu que ainda há muita gente que ficou para trás e não quer seguir em frente, num exercício de não-aceitação de realidades diferentes da sua. Aprendeu que se pode ter 29 anos em 2016, na aldeia gobal do mundo e ter a mente fechada numa cave da década de 20.
A minha amiga não gostou de ver o filme, lá no cinema. Eu não gostei de a ver a ela, lá na cave.
Pode ser que para a semana a leve a ver a Carol...