Conto Pingue-Pongue: A São e a Madalena III
A São e a Madalena - Parte I (Maria das Palavras)
A São e a Madalena - Parte II (BB)
A São e a Madalena - Parte III
Lisboa, 15 de Dezembro de 2014
Querida Madalena,
para mim parece que o Natal já foi! Quando recebi a tua carta até senti o cheiro a filhós, acreditas? Começo a achar que se abrisse a tal conta de face-coiso ia ter esta sensação mais vezes (além de ficar a par dessas notícias todas que me estás a dar), mas o meu principal problema são as fotos: sabes que não fico bem em ne-nhu-ma.
E por falar nessas tais notícias...em relação à viagem de voluntariado do Tomás, viste fotos? Tipo com um jornal para comprovar o dia em que foi tirada? É que "missão de voluntariado" soa-me mesmo a desculpa de quem não quer sair mais comigo. Mas também não acho que alguém fosse pôr isso no facebook para toda a gente ver, só para me enganar. Esquece, ele sabe que eu não tenho facebook. Ou será que eu sou tãaaaao chata e retrógada que ele até foi em missão de voluntariado para fugir de mim? Do género, "sacrifício era ter de a aturar mais um dia, antes arriscar-me a apanhar uma doença numa missão de voluntariado".
Em relação ao Miguel...eu sei que disse que era impossível, por causa daquele defeito dele. Mas sou capaz de ter saído com ele ontem. Talvez até tenha havido uma troca de beijinhos e assim..Talvez. Não estou a dizer que houve. Pelo menos até saber como reages só à possibilidade...
O Artur contou-me isso da tua irmã, sabes? Que andou com ela. Fiquei chocada...já foi depois de te escrever. Confidenciou-me isso, suponho que para me amolecer o coração e eu te dizer onde estavas. Mas é tão fácil arrancar-me segredos como um dente (morro de medo de dentistas, como sabes). Perguntinha: mas a tua irmã não tem o mesmo namorado desde a idade dos dinossauros? Isso quer dizer que...Bom, seja como for percebo o teu lado.
Muito me contas acerca do Esteban! Olé!
Mas soa-me que ele tem cabelo comprido. Artista e tal. Tem, não tem? Sabes que não se pode confiar em homens de cabelo comprido! Já a minha avó dizia. Ninguém que use mais condicionador que tu, merece o esforço (esta parte já não é a minha avó que diz).
Bom...já estou a assumir demais. Conta-me tudooooo.
Ah! A Joana foi apanhada com o chefe na sala de reuniões...de quatro! Escandaleira. Isso não viste tu no face-coiso, pois não? Durante dias não se falou de outra coisa por aqui. Por isso acho seguro dizer que tinhas razão quanto ao casamento dela. Se não acabou ainda, está para pifar breve, breve. Agora já não anda histérica por aqui, faz tudo por não dar nas vistas - too late!
Quem me dera ir ter contigo no Natal...mas estou de trocos contados. Diz-me que o trabalho aí é bom e rende, que eu mudo-me para aí num piscar de olhos. Ou então, não...sabes que esta cidade tem muito de meu para a abandonar.
Um beijo de papel,
São
Dobrou religiosamente o papel de carta com azevinho desenhado. Olhou pela janela para se certificar que ainda ninguém tinha apagado as luzes de Natal da cidade. Sofria por antecipação que terminasse aquela que era a sua época favorita do ano. A única época do ano em que era permitido acreditar em magia.
A campainha tocou. Levantou-se e espreitou pelo visor da porta. Era o Tomás. Trazia nas mãos uma Rosa de Natal; nos olhos uma esperança.
(continua)