Será que os livros morrem nas estantes?
Imagine-se uma pessoa que não é amada. Que experimentou um beijo entusiasmado e depois foi fechada numa cela vazia e quieta, sem saber se é para sempre, só com a recordação desse beijo. Por quanto tempo se sentirá viva sem propósito algum?
Não é isso que fazemos aos livros que colecionamos? Lemos todas as páginas, mais sofregamente, ou devagar, a saboreá-las. Depois fechamos a capa, encostamo-los ao peito, felizes pela leitura, tristes porque terminou. Gostámos tanto. Jamais nos poderíamos desfazer dele. Guardamo-lo na prateleira. Não o damos porque já está usado, não o vendemos porque o queremos conosco, não o emprestamos porque sabe Deus que podemos não o ter de volta, não o relemos porque já sabemos a história e gostamos de ser surpreendidos. E ele fica ali arrumado, qual peça decorativa, a ser tocado pelo espanador, volta a abrir-se se alguma vez no meio da limpeza tem a sorte de cair ao chão.
E não me digam que sou ridícula (apesar de ser verdade) e que os livros não têm vida. Quando muito, têm várias.
Então fica a questão: os livros morrem por não serem lidos?
Se assim for, nem toda a gente mata os livros (há quem se desfaça delas, quem os empreste com leveza, quem os releia incontáveis vezes), mas eu mato. E mais assassinos haverá por aí. Penso se serei capaz de deixar de ser egoísta e fazer o melhor pelo espécime em papel. Fazer até uns trocos ou fazer outra pessoa feliz. Mas sobretudo isto: ressuscitar o livro. Ou deixá-lo viver. Ser lido. É a mesma coisa. Está bem, eu vou dormir...