Fiz um hard reset ao telemóvel que andava lento por estar mais cheio de porcaria que um glutão num buffet. Certifiquei-me que os contatos e fotos estavam sincronizados e que não ia perder nada importante. Com a conta Google sincronizada até as apps voltam a ser instaladas sem ter de fazer nada, embora, claro, se não forem de login, percam a informação anterior que não foi guardada.
Esqueci-me do Bloco de Notas. Com notas preciosas. Textos, listas, excertos, dicas, receitas, nomes, sugestões de prendas. Coisas a fazer, a escrever, a lembrar, informação sobre em que botão da campainha tocar quando visitamos cada amigo e voltamos a perguntar-nos se era esquerdo ou direito...enfim. Coisas que nem me lembro - era por isso que estava lá. Uma vida (pronto, dois anos). Chorem comigo.
*Sim, tenho outros - muitos - de papel mesmo. Mas este estava sempre na ponta dos dedos.
Queria escrever. Iamos a meio de um passeio e lembrei-me de coisas que queria escrever. Precisava registar para mais tarde e as palavras eram algumas, o telemóvel não dava. Tinha uma caneta e nenhum sítio onde assentar as frases que já me estavam a querer fugir. Entramos os dois numas quantas lojinhas daquele sítio que não conhecíamos assim tão bem, mas em nenhuma havia cadernos.
Sentamo-nos numa esplanada à beira-mar, a beber uma água fresca (fosse eu uma blogger in, e poderia muito bem ser un gin). Avistei uma espécie de banca de artesanato que talvez fosse a minha salvação. Pedi licença e fui espreitar. Nada onde se pudesse escrever - só postais. Voltei ao meu lugar. Estava oficialmente de birra. Não me apetecia conversar, nem nada. Só escrever e não tinha solução. Abandonei-me ao mau feitio. Fiz que tinha cinco anos e não queria saber. De nada.
Levanta-se o Moço e desaparece por uns minutos. Eu fico a ler, contrariada. Quando reaparece tem um bloco de notas. Pequenino. Perfeito.
E ocorre-me que eu não sou assim. Que sou controlada. Que não me largo simplesmente aos problemas. Que sou uma solucionadora, que me desenrasco, que vejo o lado melhor e me adapto. Ocorre-me que a birra que faço, como se tivesse cinco anos, só a faço ao pé dele. Como talvez fizesse em pequena, ao pé dos meus pais. Ocorre-me que me sinto protegida, que sei que ele toma conta de mim. Que faço cara feia por ter a certeza que ele me arranca um sorriso a seguir. Ocorre-me a sorte que tenho por me poder dar ao luxo de fazer birras.