Lembrei-me agora que eu devorava um menu da Pans, quando ele aponta para o saquinho dos Camembert Bites (que, para quem não sabe, são a oitava maravilha do mundo das papilas gustativas) e diz:
- Ui, já acabaste com isso?
E eu, que estava certa que tinha guardado um dos quatro preciosos Bites para o final da refeição, tive um ligeiro enfarte do miocárdio até verificar que ele me estava a enganar, apresentando o seu ar de gozo, enquanto eu resgatava o sobrevivente do seu saquinho de papel.
Isto para verem como ele também consegue ser a pior pessoa do mundo, quando quer, não é só bondade que p'rali vai no coração.
Jantamos e conversamos. Eu despenteada, com o cabelo cheio de trejeitos da humidade, e de ar cansado, e ele, por mais que se esfalfe a trabalhar em turnos, e nas máquinas do ginásio, sempre com aquele ar fresco e fofo, giro-sem-esforço (se calhar eu também devia experimentar ser in e fazer a dieta dele - isso e uma operação plástica).
Como estou sempre a inventar, eis a questão que lanço para cima da mesa: se pudessemos escolher uma maneira para morrer, num futuro próximo, excluindo a hipótese "enquanto dormimos", o que escolheríamos. E enquanto eu estou a formar na cabeça a possibilidade de uma morte através de um veneno de atuação rápida, que nem chegue a fazer uma pessoa bolsar-se e perder a pose, ele diz:
- Escolhia morrer atropelado, a atirar-me para a passadeira para salvar uma criança de um carro a alta velocidade. Eu morro, a criança salva-se.
Odeio esta expressão, por mais que seja verdadeira em 97.5% dos casos. Paga-se um almoço a um parceiro para otimizar o acordo. Paga-se o almoço a um amigo para lhe pedir ou pagar um favor ou agradecer uma ajuda. Paga-se o almoço à miúda em busca de tu-sabes-bem-o-quê. Paga-se um almoço ao vizinho porque no outro dia ele nos pagou a nós.
Olho por olho, dentro por dente - filosofia execrável. Percebo a parte da troca em nome de um bem comum (respeito e uso, não minto). Mas não posso com a obrigatoriedade. A mesquinhez do ele-deu-por-isso-agora-é-a-tua-vez. O "não há almoços grátis" - adoro oferecer "almoços" sem esperar nada em troca e portanto também assumo que me façam bem sem olhar a recompensas.
Isto para dizer que hoje ia a subir as escadas do metro e uma senhora estava lá no cimo com um carrinho de bebé. Nem estava particularmente atrapalhada, mas o rapaz à minha frente prontificou-se para ajudá-la a trazer o carrinho para baixo. E eu pensei: este é dos outros 2.5%. [A não ser que depois tenha pedido à mulher para lhe carregar o passe.]