Gostava de começar por dizer que talvez a melhor solução para acabar com as cartas abertas não seja escrever uma carta aberta. Torna-se um ciclo vicioso, uma pescadinha de rabo na boca (e ninguém gosta assim tanto de pescada), uma versão com mais argumento do filme Inception.
No entanto, senti que, talvez, lá bem no fundo (ali junto ao fígado, como quem vai para a esquerda, mas segue em frente)...talvez isso fosse vontade de ter uma carta aberta dedicada a si.
Quero dizer-lhe que concordo com este flagelo da sociedade que cada vez que vem uma rajada de vento mais forte dedica uma carta aberta a São Pedro. Desde quando é que a carta aberta substituiu a velha e boa greve de fome? Ou as marchas de gente peladinha (ler com sotaque brasileiro) como forma de protesto?
Talvez por lhe admirar a luta, imitei-a na forma: combater a carta aberta com mais uma carta aberta. Porque menos com menos dá mais, não era o que diziam na escola? E olho por olho e dente por dente e outros clichés.
Aproveito para dizer que gosto do blog. Calhou, que eu nem queria. Achei que era só mais um desses blogs que se vinha fazer valer da fama de um autor e ter uma agência a debitar conteúdos. Calhou que até é um blog que foi parar ao meu feed. Onde gosto de várias coisas, nomeadamente algumas (os títulos das rubricas!). Mas como a carta aberta normalmente é para injuriar, deixem-me fazer isto em bom: Ui, os T's no tipo de letra que usam nos textos são mesmo irritantes!
Falo aqui diretamente convosco porque gostava de vos dar uma achega em relação a como funciona a mente do consumidor.
Bem sei que somos pseudo-bloggers, o nosso endereço de email é público, e muita gente nos manda informação pensando que nos possa interessar. Às vezes até é verdade, mesmo sem qualquer parceria, posso ficar a saber qualquer coisa que me interessa, para mim própria e para divulgar e nesse sentido agradeço. Podem fazê-lo de forma dirigida ao blog e pensada. Mas vou dar-vos - possivelmente - uma novidade. O meu email é público mas não é vosso. E mesmo sendo público não pode ser inserido na vossa base de dados para receber as vossas newsletters (estou a evitar chamar-lhes lixo eletrónico em massa) sem autorização prévia. Não é má vontade minha. É mesmo proibido por lei.
Mas não sejamos picuinhas e pensemos por um momento que não era proibido...
Acham que era assim que eu escolheria o meu dentista? Acham que se começarem a enviar-me todas as semanas - sem eu ter pedido nada - o vosso portfólio de dentes mais brancos e direitos eu, ao precisar de dentista, vou pensar assim: olha, e se fosse falar com aquela empresa que me começou enviar emails de enfiada, sem autorização e de forma totalmente despersonalizada? Não sei, mas parece-me que têm uma boa vibe...
Pois não é. A coisa carece de um tratamente mais cuidado. No marketing, para que depois percebamos que isso se reflete nos dentes. E na forma como tratam os clientes. Mas se nada disso vos demover, e falando agora mesmo especificamente só para os senhores do exemplo em que peguei, fiquem sabendo isto: é pouco provável que, em caso de emergência dentária...eu tenha tempo para ir ao dentista NO BRASIL.
Foco sim, meus queridos? As bases de dados autorizadas custam um pouco mais, mas, se virem bem a coisa, ficam mais baratas.
Sei o que fizeste no Natal passado. Aliás, em todos os Natais passados. Andaste a gravar anúncios para a Coca-Cola, a encher esse bandulho à custa de uma grande empresa, enquanto ignoravas todos os pedidos que te faziam à volta do mundo.
No outro dia vi-te, à entrada de um desses mercadinhos de Natal, ao pé da feira de Alverca. E estavas a escolher prendinhas nas bancas de artesanato? Ou mesmo na feira ao lado, com os ténis da Reboque a 12€? Não, estavas a acenar a todos. Feito presidente da república. As crianças até pararam de saltar no insuflável, de olhinhos brilhantes a ver o homem que lhes dá as prendas - tão enganadas que elas estão.
E olhavas para o lado a contar piadas a quem achas que te deve devoção:
- Sabem porque é que não dou prendas aos meninos em África? Porque eles não comem a sopa! OH OH OH.
Admite de uma vez. Tu não dás prendas a ninguém. O pai e a mãe é que compram as prendas, os senhores dos CTT é que respondem às cartas. Tu? Nem tomas contas dos teus. A tua rena anda constipada há anos a fio, com aquele nariz vermelho e tu não dás pevide, nem pegas no trenó para a levar ao médicos. Os teus duendes? Aparecem aí congelados de frio, que nem se mexem, nos jardins das pessoas...
Se não fossem os meus pais e o Moço, sabes há quanto tempo eu não tinha um perfume novo? Se dependesse de ti, andava aí só a cheirar a água de rosas e sabão azul. O que conseguisse juntar. Muita gente, por quem passo diariamente, nem sabão azul, informa-me o meu nariz.
Lê bem com atenção: tenho cópias desta carta prontas para seguir para todas as redações de jornais do país. Se pelas 20h do dia 20 de Dezembro não tiveres feito um comunicado ao país a repor a verdade - a César o que é de César, aos pais o mérito por gastarem uma porção preciosa do seu dinheiro para dar uma prendinha aos seus filhos - serei eu a denunciar de forma crua a tua malícia. O teu engodo.
Primeiro, e porque não sou nenhuma mal-agradecida, gostaria de vos louvar por nos permitirem comer as mesmas porcarias de sempre (hamburgueres, cachorros quentes, sandes) com nomes XPTO, que até são um orgulho de colocar com hashtag no instagram. Se mete "gourmet", "portuguesa", "artesanal", "tapas" ou "do bairro" no nome, já sabemos que conseguimos provocar inveja nos nossos amigos, e pela módica quantia de 10€ por cabeça, ou menos ainda, fazemos o luxo do mês e comemos fora de casa.
Até aqui tudo bem.
Nem me importo que usem latas de feijão como centros de mesa, cadeiras velhas todas diferentes, páginas de jornais como se fossem quadros e permitam as pessoas rabiscarem em paredes de papel ou quadro de giz, num exercício que pretende conjugar originalidade, com poupança, com partilhas nas redes sociais.
Mas...têm mesmo de me obrigar a sentar ao pé de estranhos? Tenho mesmo de ter conversas pessoais com amigos com gente ao lado?
A moda das mesas grandes, ao estilo cantina pode ser o último grito da estética e muito cool. Mas não queria muito falar dos meus dramas com público maior do que aquele que já tinha na ideia quando planeei o jantar (eu sei que sou muito engraçada e é um prazer que qualquer pessoa me possa ouvir, mas de facto não dou espetáculos de stand up - nem sit down). Ou então, também decidiram apoiar a esquerda e fazer de toda a gente do restaurante bons camaradas, mas eu se quisesse fazer amigos ia à internet, como é prática comum por estes dias.
Assim obrigam-me a ser desagradável para conseguir estar sozinha - leia-se, com companhia à minha escolha - quando frequento os vossos espaços para me deliciar. Estas são algumas das soluções que penso implementar:
Deixar de tomar banho na semana que antecede a minha ida ao local de repasto, esperando que o meu aroma acerele a refeição das pessoas ao meu lado e afaste outros pretendentes. Danos colaterais: é possível que a pessoa que vá comigo também fuja.
Descrever, de forma bem audível e exaustiva, os furúnculos da minha tia. Danos colaterais: os mesmos da tópico acima.
Criar uma linguagem em código, treinada durante meses. Dar formações intensivas às pessoas com quem quero marcar um jantar. Poderemos falar à vontade em mesas corridas com pessoas ao lado, sem que ninguém nos entenda. Danos colaterais: os mesmos dos tópicos acima, mas a desistência dá-se logo na fase do planeamento.
Adotar um furão e levá-lo comigo sempre que vou ao vosso restaurante - a espreitar da minha mala, diretamente para o prato da pessoa ao lado. Danos colaterais: expulsão do restaurante e possível internamento.
Para além disto, caríssimos, a minha companhia mais frequente é, como não poderia deixar de ser, o meu moço. E ele distrai-se muito facilmente. Quando estamos num restaurante já me vejo obrigada a competir com o telemóvel dele, as TV's ligadas, as pessoas que frequentam o mesmo espaço, os carros que passam na estrada e espelhos ou qualquer objeto em geral onde ele possa ver o seu reflexo. Se eu tiver de competir também com a conversa dos outros...ou uma louraça sentada ali mesmo ao lado dele...estão a ver, não estão?
Esta carta aberta não é tanto uma crítica, como um pedido de ajuda. Penso que compreendem. Podem mesmo deixar as mesas assustadoramente perto, mas com uma abertazinha ao menos?