[Para a A., para a Mafalda, para a Xana, para quem já quase não acredita.]
É uma infelicidade que o amor não chegue como queremos. E que, tantas vezes, não chegue em quem queremos. É uma infelicidade que nos tolda a esperança, o otimismo meio fingido que exibimos em sorrisos. É uma infelicidade que nos faz sonhar a cada esquina e desanimar a cada golpe de realidade.
Porque um dia é aquela a pessoa. É aquele o momento. E nós não fizemos nada de diferente, nem somos outro ser que não o que sempre fomos. Mas vamos deixar de ter dúvidas e passar a ter certezas.
O homem certo no momento certo não engana: quer saber, rir, chorar, estar e ficar conosco - uma coisa de cada vez e, às vezes, tudo ao mesmo tempo. E não nos deixa duvidar por um momento - um só - que é ele.
Entretanto não fechem o vosso coração. Vão precisar de o ter preparado para esse dia. Confiam em mim?
Ainda só lhe vejo a silhueta. O nevoeiro parece menos espesso, menos sufocante. Será sensação apenas? Espada em punho, lá vem ele. Virá de azul ou de verde? Terá perdido a máscara que compunha a armadura? Estará o escudo partido? Já ouço a multidão a aplaudir, a bradar aos céus de contentamento. Vai ficar tudo bem, D.Sebastião voltou. Hei-de dar-lhe uma palmadinha nas costas, dizer obrigada. Tanto tempo perdido e conseguiu regressar. Mais que isso: quis regressar. Há que explicar-lhe que farmácia já não se escreve com ph, arranjar um telemóvel ao homem: ó rapaz, qual é o tarifário mais barato agora? Tanta coisa mudou enquanto ele foi e veio. Será mesmo ele que emerge ali do nevoeiro?
Podem ser afinal só os olhos turvos de lágrimas que me iludem e me fazem ver coisas onde não estão. Pode não ser ainda o homem. Mas é definitivamente a esperança que aí vem.
Até vinha a calhar que passasse. Que eu acreditasse que do 31 para o dia a seguir, algures entre o champanhe e as passas (e eu que não gosto de nenhum!), há um filtro, um coador de café, mas grande - para a vida. O grão ficava preso em 2014 e só passava o que há de mais fino e suave - os sonhos e os sorrisos que não se apalpam mas se sentem.
O ano novo não traz nada de bom - pelo menos nada que nós não possamos trazer a cada dia do ano, sem ajuda do calendário e fogo de artifício à volta do mundo, ao bater de cada hora, em cada lugar.
As coisas boas, como as coisas más, não trazem data marcada e não sabem quando vestir lantejoulas para a festa.
Há dez anos atrás, quando o meu avô morreu de 31 para o dia a seguir, o ano não passou. E desde aí que os anos não passam na contagem decrescente de um minuto de Dezembro para outro em Janeiro. Passam nesse ou noutro dia qualquer quando a minha história muda para melhor. Conto que o ano passe algures em 2015, para mim e para os meus: que o calendário vire, dia circundado a vermelho vivo numa semana qualquer. Mesmo que não seja na noite em que o mundo todo o quer celebrar. Mesmo que seja em todos os dias menos neste.
Pára de chorar E dizer que nunca mais vais ser feliz Não há ninguém a conspirar Para fazer destinos Negros de raiz Pára de chorar Não ligues a quem diz Que há nos astros o poder De marcar alguém Só por prazer Por isso pára de chorar Carrega no batom Abusa do verniz Põe os pontos nos Is Nem Deus tem o dom De escolher quem vai ser feliz