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Maria das Palavras

A blogger menos in do pedaço, a destruir mitos urbanos desde 1986. Prazer.

28
Jul15

À Janela

Maria das Palavras

Pixabay free images | Public Domain - Janela / Window

  

Ali estava ela, na janela do 5ºB, a olhar para o mundo que se estendia à sua frente a partir de Lisboa. Que pequena que era. Que sozinha que estava. 
Toda a gente tinha alguém. Estavam de férias com as caras-metades ou aquele grupo de amigos inseparável. Toda a gente tinha um programa mais interessante do que estar à janela naquele domingo ameno. Só ela é que não.

Então tinha tempo para maldizer a sua vida cinzenta. Mesmo que em todos os dias da semana,a todos os que se cruzassem com ela, mostrasse uma montra colorida, em forma de sorriso. O "como estás" responde-se automaticamente com "bem", o "está tudo bem" responde-se automaticamente com "sim". E de resposta correta (mas incompleta) em resposta correta (mas incompleta) se constrói uma fachada pintada de fresco em cima de paredes de cimento áspero. 

Não é que não fosse genericamente feliz, que não tivesse amigos do peito, uma família quente de ternura. Mas o que lhes diria? Que não, não estava bem. Que sentia que todos eram mais do que ela, mesmo que ela soubesse que era tanto como os outros? E que importância tinha isso ao pé de quem não tem saúde ou comida suficiente todos os dias? 

E era uma pena que estivesse ali sozinha, sabendo que tinha tanto para dar. Podia ser engraçada, espirituosa, inteligente, uma de cada vez ou todas ao mesmo tempo. Era um desperdício que tivesse aquele cabelo sedoso, que entraçava sozinha, e  ninguém que o percorresse com os dedos, a acompanhar com uma declaração de amor.

O mundo tão grande e ela tão pequena. Toda a gente acompanhada e ela sozinha. Com um suspiro, fartou-se de estar a janela a pensar no que não tinha e virou-se soltando alguma folhas secas da planta que mantinha no parapeito da janela, sem regar.

 

No 3ºB estava o Eduardo à janela. Viu as folhas secas a cair à sua frente, sem  interromper os seus pensamentos. A sua mágoa por ser o único a estar sozinho no mundo.

 

No outro lado da rua a Sofia pensava exatamente o mesmo. Como o Tomás, em Viseu. A Catarina, em Évora. O Pierre, em Lyon. A Johanna, na Suécia. O Matthew, em Los Angeles. O Marcos, no Brasil. 
 

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